Odete dos Santos
Eu
sempre quis ter um filho, mas nunca havia conseguido engravidar. Fui casada por sete anos, e tive alguns relacionamentos, mas nenhum deles me trouxe a realização
do sonho da maternidade.
Eu
já havia até deixado de lado este desejo de ser mãe quando, aos 43 anos, em uma
consulta médica de rotina, escutei da profissional que me atendia que ainda
havia chances. Isso me fez voltar a ter esperança, me fez sonhar novamente com
a possibilidade de poder gerar um bebê. E eu comecei então uma busca pelo pai do
meu futuro filho.
Minha
gestação foi mais do que planejada, e em outubro de 2001 eu estava grávida. Já
me sentia grávida antes mesmo do atraso menstrual, e o Beta HCG só veio
confirmar minha suspeita. Que felicidade!
Fui
feliz por um período muito pequeno, exatamente de 17 de outubro até 8 de
novembro. No dia 3 de novembro, percebi um discreto sangramento ao urinar. Fui
a um Pronto Socorro, onde fui informada de que o colo do útero estava fechado.
Como não havia mais sangramento, e era um sábado, solicitaram um ultrassom para
dois dias depois. A forma como fui tratada me chocou. Escutei da profissional
que deveria cuidar da minha saúde e de meu bebê as seguintes palavras: “se
tiver que abortar, não há o que fazer. Mulheres com a sua idade têm fetos e bebês
com problemas”.
Voltei
para casa, e o sangramento retornou. No ultrassom, que só foi realizado na
segunda-feira, o médico não conseguiu visualizar batimentos cardíacos. Embora
minhas contas apontassem uma gestação de sete semanas (e não havia dúvidas, já
que fiz o bebê com data e hora marcada), o ultrassom acusava apenas cinco
semanas.
No
dia seguinte, com sangramento mais intenso, levei o exame para a obstetra que
me acompanhava,e saí do consultório com a receita de continuar em repouso e
tomar um medicamento para inibir contrações. O colo estava fechado, disse ela.
Mas mesmo assim, foi neste dia que perdi meu bebê.
Durante
toda a madrugada eu senti dores e perdi sangue. No dia seguinte, um novo
ultrassom constatou que eu havia perdido a tão esperada gravidez, e que teria
de passar por uma curetagem.
Eu queria muito saber o que houve. Minha obstetra e meu homeopata acreditavam ter sido uma má formação do feto. Para mim, restou uma terrível sensação de fracasso, um sentimento de que não havia sido feito tudo o que era possível para salvar meu filho.
Eu queria muito saber o que houve. Minha obstetra e meu homeopata acreditavam ter sido uma má formação do feto. Para mim, restou uma terrível sensação de fracasso, um sentimento de que não havia sido feito tudo o que era possível para salvar meu filho.
Com
a ajuda dos grupos de apoio na net, consegui superar, e resolvi me preparar
para uma nova tentativa. Procurei um novo médico, fiz exames de dosagem
hormonal e histeroscopia diagnóstica.
O
médico pediu seis meses de prazo antes das tentativas, mas eu não aguardei.
Mesmo assim, o bebê não vinha. A cada nova menstruação, um novo sofrimento. Por
minha conta aprendi a tirar a temperatura basal, e a registrava religiosamente
todos os dias. Observando a evolução do meu ciclo, passei a conhecer melhor meu
corpo, e em julho de 2002 consegui finalmente engravidar de novo.
Foi
uma festa, antes de fazer o teste eu já me sentia grávida, surpreendi até mesmo
meu médico. Confirmada a gravidez, fiz meu primeiro ultrassom com quatro
semanas. O exame não mostrou nada, apenas o endométrio aumentado. Mas ainda era
cedo para ver o embrião, e eu sentia meu filho. Estava feliz, com medo mas
feliz.
Alguns
dias depois, senti dores novamente. Segui a orientação de meu médico e fui mais
uma vez a um Pronto Socorro. Lá, além de ser medicada, fiz um novo ultra.
Novamente, nada de ver o bebê, o que me deixou apreensiva.Para aumentar minha
angustia, questionaram se eu tinha um exame de Beta HCG positivo.
A
recomendação médica foi de repouso por uma semana. Depois disso, um novo
ultrassom. Eu estava então com seis semanas de gestação. Desta vez, o bebê foi
visualizado, mas não os batimentos cardíacos. Saí do laboratório aos prantos e
liguei para meu médico, que me acalmou e pediu que eu fosse ao seu consultório
no dia seguinte. Foi solicitado então um novo Beta HCG, desta vez quantitativo,
e outro ultrassom. O beta estava alto (25.000 mUI/mg), mas mas nada de
batimentos no ultrassom. Desespero. Este ultra dizia que eu estava com cinco
semanas, e fui avisada de que talvez minha gravidez não evoluísse bem.
De
novo meu médico me acalmou e pediu para repetir o beta e o ultrassom em uma
semana.
O
resultado do exame de sangue foi 26.000 mUI/mg, mas no ultrassom nada de
batimentos. Eu havia tido um aborto retido.
Meu
coração me falava isto, mas eu quis acreditar que aconteceria um milagre. Aprendi nesta perda que não existem milagres, e por isto devemos ficar atentas
ao menor sintoma que sentimos.
Mais uma curetagem, e desta vez mandei o material para análise. O resultado do
cariótipo fetal do bebê foi indefinido, pois o "material" retirado foi insuficiente para qualquer diagnóstico. Dias depois perdi meu filho definitivamente, pois comecei a ter contrações e meu filho finalmente saiu de dentro de mim, a curetagem anterior não retirou o bebê.Passei por nova curetagem, eu me sentia agredida, maltratada, sozinha, inconsolável. Uma dor absurda, doía minha alma!
* Este depoimento foi
escrito em setembro de 2004. Depois desta perda Odete criou o grupo de apoio Unidas pela Dor, uma forma de se ajudar e ajudar outras mulheres neste momento de dor. Através do grupo muitas mulheres conquistaram a sonhada maternidade. Ela continuou tentando, e aos 48
anos nasceram seus filhos, um casal gerado através de ICSI, mas aos vinte dias de vida sua filha faleceu, e a perda bateu mais uma vez na sua porta. Mas nem tudo foi tristeza pois seu filho sobreviveu e somente lhe traz alegrias.
Ana Paula
É muito
doloroso pra mim ficar lembrando de tudo: já faz tanto tempo!!! Foi em 1994,
numa sexta-feira 13 (de maio), mas parece que foi ontem.. Tenho guardado na
memória cada detalhe, cada minuto e cada palavra ouvida naqueles dias…
Eu
estava grávida de 28 semanas, do meu segundo filho. Tinha feito um ultrassom na
véspera e estava tudo bem com meu garoto, com meu corpo, ótimo… mas naquele dia
eu não senti ele mexer. Lembro que comentei com meu marido: se ele não chutar
até a noite, ligo para o médico para saber se é normal… mas eu deitei e dormi
(eram 8 da noite, mas grávida tem sempre muito sono, né?), e acordei à meia
noite com um sangramento pequeno.
Ligamos
para o médico, ele pediu para irmos com urgência para o hospital, onde ele nos
encontraria. Nessa altura já era uma hemorragia. Coloquei uma toalha de banho
no meio das pernas e fui…. Tive que levar meu filho mais velho, então com três
anos, pois a família estava a 200 km de distância.
Entrei
sozinha no hospital, meu marido ficou com meu filho no carro, me internei, o
médico me examinou, o bebê estava vivo, mas em sofrimento, os batimentos
cardíacos fracos.. fui internada, com um monte de remédios e exames. Mas meu
bebê morreu à noite, eu senti. Eu rezei muito desde a hora que sai de casa
sangrando até o dia seguinte, sem parar. Eu acho que falava em voz alta, com
meus santinhos, com Nossa Senhora, e pedia muito para que tudo acabasse bem.
Houve um momento em que devo ter cochilado, porque tenho certeza que não dormi,
e “senti” alguém vindo buscar meu bebê.
No
dia seguinte de manhã, quando fizeram o ultrassom, ele já estava morto. Eu e
meu marido decidimos por uma cesárea, porque eu não queria sofrer ainda mais.
Neste momento, decidi também que nunca mais ia querer ter filhos.
Eu tenho
o útero bicorno e septado, PODE ter sido essa a causa do descolamento de
placenta que eu tive, pois eu não tinha feito esforço físico nenhum, nada que
justificasse… mas nenhum médico me disse que foi isso, mesmo porque eu já tinha
isso quando nasci e tive um filho perfeito, de 9 meses, normal.
Foi tudo
muito doloroso: a perda, registrar o bebê, comprar caixão, enterrar. Achei uma
enorma insensibilidade das enfermeiras, que vieram tirar o bercinho do meu
quarto, antes do parto. Senti que pensavam: “já está morto mesmo, pra que o
berço?”. Eu penso que deveria existir uma ala especial no hospital para esses
casos, pois é dolorido demais ficar ouvindo chorinhos de bebês e outras
mães recebendo flores.
Ouvi
muitas vezes frases como “você é jovem pode ter outros; Deus sabe o que faz,
ele poderia ser doente”. Foi duro demais. Doei todo o enxoval, o berço o
carrinho, meu peito escorria leite (porque a injeção não funcionou). A festa de
aniversário do meu filho mais velho estava programada para a semana seguinte, e
15 dias depois mudaríamos. Eu decidi que nunca mais engravidaria, pois não
havia solução médica para resolver meu útero bicorno.
Mas em
1998 eu me mudei para Campinas, e na época uma prima descobriu que tinha o
mesmo útero bicorno. O médico disse para ela que dificilmente engravidaria… ela
era solteira e depois de escutar isso deixou de tomar precauções para não
engravidar. E não é que ficou grávida rapidinho? Mudou de medico e procurou um
especialista para poder ter o bebê dela em paz, estava com medo que minha
história se repetisse. Ela fez a cerclagem (que eu nunca tinha ouvido falar) e
teve o bebê dela perfeito, então comecei a pensar novamente no assunto, e até
me consultei algumas vezes com o mesmo médico, que me pediu alguns exames,
ultrassons e não viu nada de errado comigo.
Mas
quando tudo parecia que estava preparado, meu marido recebeu uma proposta para
trabalhar na França, e lá fomos nós, sem conhecer nada e ninguém, sem falar nem
bonjour! Adiamos os planos do bebê de novo. Mas depois de um ano lá, uma amiga
me indicou um médico especialista em gravidez de risco, e lá fui eu. Fiz de
novo alguns exames, ultrassons e etc. E nada de errado foi constatado, além do
meu utero bicorno e septado, que segundo ele não é motivo para não ter filhos.
Fiquei
grávida em 2001, comecei tomando aspirina infantil desde o resultado positivo,
fiz repouso para não provocar o descolamento prévio da placenta de novo, não
dirigi, nada de relações, nada de passeios longos, caminhadas, nem carregar
peso. Um sufoco, foi uma gravidez horrível. Alguns sangramentos, muitos
ultrassons, muitas ligações para hospital de madrugada. E mesmo assim tive um
bebê prematuro, porque a bolsa estourou (com 30 semanas).
O Alex
nasceu no dia 22 de agosto de 2001, com um quilo e meio, e ficou 37 longos dias
no hospital e hoje está aqui, com a família dele: pai, mãe, irmão, tios e tias
e vós (porque voltamos para o Brasil no mês de abril) e eu fiquei um pouco
revoltada com médicos, hospitais e etc… porque apesar de ter sido muito bem
tratada, acho que faltou muita informação por parte dos médicos, enfermeiras e
outros profissionais. É tudo muito ético, muito profissional... e nada HUMANO.
Meu
final foi feliz afinal, o Alex é perfeito, não tem nenhuma sequela e é lindo.
O que eu
acho interessante nesses fóruns, grupos e outros bate papos do tipo é poder
colocar a minha história, poder ouvir outras iguais, parecidas e muito
diferentes, e saber de como é diferente a reação de cada pessoa diante de um
mesmo fato (uma perda), de como cada uma reage, uma vai no cemitério todo dia,
outra não vai nunca, outra dá tudo embora, outra guarda tudo de lembrança, tem
gente que briga com Deus, outra que se agarra nele com toda força, muita gente
briga com a família, amigos e outros nem ligam para nada que ouvem. O
importante disso tudo é que a gente conhece e sabe da dor que a outra está
sentindo e respeita cada decisão que ela tomar, e acho que nenhum psicólogo,
médico, mãe ou ninguém que nunca tenha perdido um filho pode saber de verdade o
que sentimos e nem tentar criticar ou avaliar o que fazemos…
* Este depoimento foi escrito em 2002. Ana Paula mora fora do Brasil e tem dois filhos, o mais novo, nascido após a perda relatada, há 14 anos.
Betânia Araújo
Meu nome é Betania, tenho 42 anos
e me casei em fevereiro de 2000. Como logo após o casamento fomos morar em
Manaus, longe de toda a família, adiamos um pouco o desejo de filhos. Em 2003,
depois de sairmos de Manaus, decidimos que era hora... nem por um segundo
imaginei que fosse ter alguma dificuldade.
Parei com o anticoncepcional e na
primeira tentativa, engravidei. Quando peguei o resultado de Beta, fiquei
eufórica e logo em seguida fui ao médico. Pra minha tristeza, ele não ficou
muito satisfeito com o resultado do exame e disse que pela data da minha última
menstruação, o Beta deveria estar mais alto, e sugeriu que eu repetisse em
alguns dias. Fiquei encucada, mas ainda assim, achei que tudo ia dar certo.
Repeti o Beta e o resultado foi
bem mais alto... fiquei mais aliviada. Meu médico ainda não estava “satisfeito”
e foi me deixando cada vez mais preocupada. Primeiro US.... nada. Médico
sugeriu que repetisse em alguns dias... que agonia. Novo US... saco gestacional
mas nada de embrião. Pequenos sangramentos... injeções de gestadinona e
repouso. Outro US alguns dias depois e meu sonho acabou... era uma gravidez
anembrionada (sem embrião). Fiz a curetagem, em agosto de 2003 e voltei a tomar
anticoncepcional. De acordo com meu médico, foi uma fatalidade, aparentemente
eu não tinha nenhum problema e poderia tentar novamente dentro de 4 meses.
Em abril de 2004 parei com o
remédio e na segunda tentativa estava grávida novamente. Que alegria!!!! Desta
vez fui mais reservada... só família e amigos mais íntimos ficaram
sabendo. No primeiro US já deu pra ver o
embrião e os batimentos cardíacos
evidenciados. Mesmo assim eu ainda não me sentia segura. Comecei a ter
sangramento, não era bem sangue, mas uma coisa escura. Meu médico recomendou
repouso e injeções semanais de gestadinona. Parecia que estava tudo bem, ouvi o
coraçãozinho no consultório do médico (era minha última consulta com ele pois
estava de mudança).
No dia 20/07/2004 me mudei pra
São Paulo e a primeira providência foi procurar um novo médico. O novo médico
foi muito atencioso e logo pediu um US. No dia do exame eu estava angustiada,
acho que fiquei meio traumatizada com US.
Estava com 13 semanas, acho, e
seria minha primeira US abdominal, as outras tinham sido transvaginais.
Para meu desespero, não aparecia
nada no US. Como era possível????
Fui para o Pronto Socorro... o
sangramento tinha voltado.
No outro dia, fiz novo US
(transvaginal) e o que eu temia aconteceu... meu bebê tinha parado de se
desenvolver, os batimentos cardíacos tinham cessado.
Já fiquei internada e fiz a
curetagem neste mesmo dia. Não sei se ainda é assim, mas além da dor física da
curetagem, tem a dor emocional...me colocar em um quarto com várias grávidas,
felizes, com seus filhos na barriga...
Novo médico... este me deu mais
atenção e solicitou vários exames que eu nunca tinha feito. Aparentemente eu não tinha nenhum problema e
então voltamos às tentativas de engravidar naturalmente. Se em 7 meses, não desse certo, voltariamos às investigações.
Depois do segundo aborto, minha
pressão se alterou e passei a fazer uso de remédios para controle da pressão
arterial.
Todo mês eu ficava super ansiosa
perto do dia de menstruar e quando a dita cuja aparecia, meu mundo desabava.
Mas graças a Deus logo encontrava forças pra continuar lutando.
Só de pensar numa possível
terceira perda, eu entrava em desespero.
Em julho de 2005 engravidei
naturalmente, pela terceira vez! Dessa vez fomos ainda mais discretos! Dava até
medo de ficar feliz...
Tive alguns sangramentos,
placenta baixa...mas no fim, meu maior sonho se realizou...Mateus, meu
"presente de Deus" veio ao mundo, saudável, lindo e perfeito, no dia
26/ 04/2006!
Em fevereiro de 2009 engravidei,
pela quarta vez. Tirando pequenos sangramentos e os fantasmas que rondam quem
já sofreu aborto, foi uma gestação muito tranquila. E em 19/11/2009, com exatas
40 semanas, nasceu Gabriel, pra completar nossa família!
Se não tivesse dado certo,
acredito que ainda hoje, 10 anos depois, eu continuaria tentando!
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